|

Eu, Amelia

Amelia Barrera Lara (87) dedicou mais da metade de sua vida a cuidar dos outros: primeiro como filha e irmã, depois como esposa, mãe, avó e bisavó. Ela criou mais de 30 pessoas. “As mulheres não precisam estudar; o que elas precisam é aprender a passar roupa, lavar e cozinhar para cuidar do marido e dos filhos”, seu pai repetia enquanto ela crescia. Hoje, com as cicatrizes que uma vida inteira de serviço deixou em seu corpo e em sua mente, Amelia começa a descobrir como cuidar de si mesma, sem ter a culpa como companheira. Mas surge a pergunta: quem cuida das cuidadoras?

Esta série é sobre minha avó. Ela mergulha na intimidade das mulheres cuidadoras, explorando como a criação dos filhos, o serviço e os múltiplos trabalhos de cuidados afetam sua saúde mental, física e seus próprios projetos de vida.

Ela reconhece o peso dos papéis de gênero historicamente impostos sobre seus corpos e suas existências, mas também, como uma aposta política, coloca o foco em suas resistências cotidianas. Ela celebra sua agência como aquele lugar a partir do qual elas desafiam o estabelecido e ousam continuar sonhando e construindo a vida que desejam.

Na Colômbia, muitas mulheres não conseguem acessar o mercado de trabalho porque dedicam grande parte de suas vidas a cuidar de outras pessoas. De acordo com o DANE, elas realizam mais de 75% do trabalho doméstico e de cuidados não remunerados do país. Ao chegar à velhice, enfrentam o abandono e a precariedade, sem pensão nem redes de apoio, apesar de terem sustentado durante décadas a vida dos outros. Essas dinâmicas são uma forma de violência de gênero estrutural que é herdada e normalizada.

As mulheres idosas que continuam cuidando, como Amelia, fazem parte de um grupo historicamente invisibilizado. Embora os estudos sobre o envelhecimento raramente se detenham em suas experiências, pesquisas na Colômbia e na América Latina alertam sobre a sobrecarga, o isolamento e a deterioração de sua saúde física e emocional. Reconhecê-las é fundamental para pensar o cuidado a partir de uma perspectiva intergeracional e de justiça social.